Síndrome de Gabriela: A Barreira entre a Tradição e a Aprendizagem para a Mudança
Por Carlos Magalhães
Introdução
A expressão “Síndrome de Gabriela” tornou-se popular no Brasil como metáfora para descrever indivíduos ou organizações que resistem à mudança. Sua origem remonta à personagem Gabriela, criada por Jorge Amado no romance Gabriela, Cravo e Canela (1958), cuja identidade era expressa na célebre frase:
“Eu nasci assim, eu cresci assim, e sou mesmo assim: vou ser sempre assim – Gabriela.” (Amado, 1958)
Essa postura traduz-se, na prática, em comportamentos de inércia, apego a rotinas obsoletas e recusa em adotar novos modelos, mesmo diante de evidências de sua ineficiência. Trata-se de um fenômeno comportamental que pode ser analisado sob diferentes perspectivas — psicológica, organizacional e educacional.
Características da Síndrome de Gabriela
• resistência consciente ou inconsciente à mudança;
• apego a práticas tradicionais, ainda que desatualizadas;
• negação da necessidade de adaptação ao contexto;
• conformismo com o status quo.
Segundo Kotter (2012), a resistência à mudança não é, em essência, irracional. Pelo contrário, “ela costuma ser um reflexo natural da percepção de risco, da incerteza quanto ao futuro e da ausência de uma comunicação clara sobre os motivos e benefícios da transformação” (Kotter, 2012, p. xx). O autor destaca que a mudança organizacional frequentemente falha porque os líderes não conseguem gerar um senso genuíno de urgência nem articular uma visão convincente que mobilize as pessoas.
O senso de urgência, para Kotter (2012), não se confunde com pânico ou pressão improvisada, mas com a construção de uma consciência coletiva de que manter o status quo é mais arriscado do que transformá-lo. Trata-se de uma energia catalisadora que move a organização da complacência para a ação.
📘 Destaque – Kotter (2012): “Sem um senso de urgência real, qualquer esforço de mudança corre o risco de fracassar.”
Complementarmente, Chiavenato (2014) enfatiza que a resistência encontra terreno fértil em culturas organizacionais de rigidez hierárquica, centralização excessiva e valorização de práticas antiquadas. Tais contextos desestimulam o pensamento crítico e a inovação, fazendo com que a mudança seja vista como ameaça, e não como oportunidade.
📘 Destaque – Chiavenato (2014): “As pessoas resistem menos à mudança quando compreendem os motivos e participam do processo.”
Outros estudiosos reforçam essa visão. Motta (2001) analisa que a transformação organizacional exige redesenho de processos, mas também um esforço deliberado de mudança cultural, condição indispensável para sustentar inovações. Minicucci (2005), ao aplicar a metáfora da Síndrome de Gabriela ao setor público, observa que a cultura burocrática intensifica a inércia e retarda adaptações necessárias. Pfeffer e Sutton (2006) complementam que organizações permanecem presas ao passado não por falta de conhecimento, mas por incapacidade de transformar o saber em ação efetiva.
Frases recorrentes que revelam sintomas da Síndrome de Gabriela
A Síndrome de Gabriela manifesta-se também por meio de expressões cristalizadas no discurso corporativo. Muitas vezes ditas sem reflexão crítica, essas frases revelam padrões de pensamento que bloqueiam a inovação e a aprendizagem.
Frases de conformismo e imobilismo
• “Sempre fizemos assim e sempre deu certo.”
• “Se está funcionando, por que mexer?”
• “Aqui as coisas são diferentes, isso não se aplica.”
• “Não precisamos reinventar a roda.”
Frases de desculpa cultural ou histórica
• “Nossa cultura não permite esse tipo de mudança.”
• “Isso pode funcionar lá fora, mas não aqui.”
• “A empresa nasceu assim e vai continuar assim.”
• “É o nosso jeito de trabalhar.”
Frases de resistência pessoal
• “Não tenho tempo para aprender algo novo.”
• “Já estou há anos nessa área, não preciso mudar.”
• “Não foi assim que aprendi e não vou mudar agora.”
Frases de minimização do risco ou da inovação
• “Esse modismo vai passar.”
• “Vamos esperar outra empresa testar primeiro.”
• “Não vale o esforço mudar um processo que já existe.”
• “Melhor não mexer em time que está ganhando.”
Frases de comodismo organizacional
• “Aqui não é o lugar para inovações.”
• “Sempre entregamos dentro do esperado, para que arriscar?”
• “O cliente nunca pediu isso.”
• “Já estamos no mercado há décadas, sabemos o que fazemos.”
Essas frases funcionam como mecanismos de defesa psicológica, racionalizações da inércia ou justificativas culturais para a permanência do status quo. Embora compreensíveis do ponto de vista humano, se não forem ressignificadas tornam-se barreiras objetivas à mudança e ao desenvolvimento.
Reflexão final
Para refletir: juventude não garante inovação, assim como maturidade não significa resistência. A disposição para inovar ou resistir não está na idade, mas na mentalidade.
Referências Bibliográficas
• Amado, J. (1958). Gabriela, Cravo e Canela. São Paulo: Companhia das Letras.
• Chiavenato, I. (2014). Gestão de Pessoas. Rio de Janeiro: Elsevier.
• Kotter, J. P. (2012). Liderando a Mudança. Porto Alegre: Bookman.
• Motta, P. R. (2001). Transformação Organizacional. São Paulo: Atlas.

