Construindo CSCs Resilientes

Por Carlos Magalhães

O aumento da incerteza econômica e comercial em todo o mundo é evidenciada pela preocupação refletida em indicadores como o Índice de Incerteza do Comércio Mundial (WTU), criado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) com base em relatórios de países da Economist Intelligence Unit (EIU). O índice revela uma escalada significativa na incerteza relacionada ao comércio internacional nos últimos anos (International Monetary Fund, 2024).

1. Introdução

Já o Banco Mundial, em suas "Perspectivas Econômicas Globais", destacou que o aumento das incertezas relacionadas às políticas públicas e as mudanças adversas nas políticas comerciais representam riscos significativos para a economia global (World Bank Group, 2025). Além disso, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) observou que, embora haja sinais de redução das taxas de inflação sem grande sacrifício do nível de atividade econômica, o cenário não é isento de riscos. Entre eles, destacam-se possíveis pressões inflacionárias e o elevado endividamento público, que podem limitar a capacidade de resposta da política fiscal em caso de necessidade (Ipea, 2024).

Ou seja, a incerteza econômica e comercial está em ascensão globalmente, influenciada por tensões geopolíticas, políticas comerciais imprevisíveis e outros fatores que afetam a estabilidade econômica mundial. As empresas estão sentindo as repercussões das tensões políticas e econômicas, de disputas sobre comércio e quem deterá o domínio das tecnologias inteligentes, e questionamentos sobre os caminhos que serão tomados para o crescimento das grandes economias desde China e Índia à União Europeia e aos Estados Unidos.

Enquanto isso, o mercado segue seu rumo de reinvenção, quase diária para orquestrar outras forças influenciadoras dos consumidores. Desde a ascensão do comércio eletrônico no varejo, novas soluções de mobilidade e busca de redução de custos e eficiências logísticas como a direção autônoma no setor automotivo e marítimo, poucas indústrias foram poupadas do impacto de interrupções tecnológicas. 

As novas tecnologias digitais também estão reformulando a maneira como as operações são feitas, com automação sofisticada fornecida pela Internet das Coisas (IoT), por exemplo, ou o uso de análises avançadas e tecnologias de autosserviço desenhadas com algoritmos de inteligência artificial para apoiar ou aumentar a tomada de decisão humana (Paramesha, Rane, & Rane, 2024).

Essas mudanças trazem oportunidades significativas, além de riscos. Em resposta, os Centros de Serviços Compartilhados (CSC) de vários setores devem estar transformando seus catálogos de produtos, rotinas, processos e modelos operacionais adequando à sua realidade de negócio. Mas agora, eles precisarão ir ainda mais longe, acelerando iniciativas internas e buscando novas formas de colaboração com clientes, fornecedores e parceiros. Com tantas variáveis ​​em jogo, no entanto, o desafio para muitas organizações e suas estruturas de Serviços Compartilhados será aprender a prosperar em um mundo de turbulência contínua.

O passado fornece uma pista. Algumas empresas tomaram decisões estruturais, estratégicas e operacionais que melhoraram drasticamente sua capacidade de desempenho diante da volatilidade e da incerteza. Muitas organizações foram bem-sucedidas, mas para uma visão curta de tempo e de perspectiva. Buscaremos explicar, neste artigo porque os desafios futuros podem exigir uma abordagem ainda mais ousada e porque as empresas devem se esforçar para aumentar a flexibilidade de suas cadeias de valor de ponta a ponta.

Baixar em PDF!

2. Lições do Passado

Um período significativo de volatilidade na história recente foi a recessão global desencadeada pela crise financeira ocorrida no período de 2007 a 2009, nos Estados Unidos. Em setembro de 2008, a falência do banco de investimentos Lehman Brothers, configurou-se a crise financeira que já vinha se manifestando em alguns países, como um fenômeno global e sistêmico, afetando a economia de praticamente todos os países, com efeitos como a restrição de crédito ou pela contração do comércio internacional. Seguiram-se ao Lehman Brothers outros gigantes, como Bank of America, a seguradora AIG e até empresas de outros setores, como a General Motors e a Chrysler. O motivo... a derrocada do sistema imobiliário americano. Nos anos seguintes ao início dessa crise, o PIB global caiu 1,9%, sua contração mais acentuada e generalizada na era moderna. A produção industrial, o comércio e o investimento despencaram na maioria dos países desenvolvidos. A taxa de desemprego nos EUA dobrou (Acioly, & Pimentel, 2011).

  A crise econômica brasileira de 2014, também conhecida como a recessão de 2015/2016, crise político-econômica ou a grande recessão brasileira, teve início em 2014, embora só fosse claramente percebida nos anos seguintes, na mídia, a figura mais icônica foi apresentada em duas edições da revista The Economist: Brazil takes off e Has Brazil blown it? O produto interno bruto (PIB) do país caiu 3,5% em 2015 e 3,3% em 2016, e mais os impactos econômicos causados pela pandemia COVID tem influências similares numa história mais recente (G1, 2019).

Capas da The Economist em 2009 e 2016. Fonte: G1, 2019.

Uma pesquisa da consultoria McKinsey analisou o desempenho durante estas crises Com cerca de 1.000 grandes empresas de capital aberto de vários setores da indústria. Essa pesquisa identificou um subgrupo de organizações resilientes que proporcionaram um crescimento no retorno total aos acionistas (TRS) estruturalmente superior à mediana em seu setor. O desempenho dessas empresas caiu menos no geral durante a recessão e melhorou mais rapidamente durante a recuperação econômica subsequente (McKinsey, 2019). 

Alguns analistas sugerem que essas empresas foram bem-sucedidas porque se moveram mais e mais rápido antes, durante e após a crise, ou seja, faziam monitoramento ativo de seus indicadores. Em 2007, 2014 e final de 2020, por exemplo, estas empresas estavam enxugando seus custos administrativos e estruturas, enquanto a maioria das empresas a acumulava e vendiam seus produtos negócios com baixo desempenho. Eles também dobraram a eficácia operacional. No primeiro trimestre dos anos subsequentes, tais empresas haviam cortado seus custos operacionais em 1%, enquanto os de seus pares continuaram a crescê-los. Essa ação diferenciada fez com que as organizações mais enxutas tivessem acesso a mais dinheiro e o usaram com sabedoria: mantendo seus relacionamentos com os principais clientes durante a recessão e adquirindo ativos e empresas de concorrentes com dificuldade de recuperação.

3. Amanhã não é ontem

A experiência do passado pode gerar informações importantes para o planejamento das empresas para desafios futuros, mas não fornece um plano de ação. Em parte, porque o mercado atual de alta volatilidade é improvável que a história se repita da mesma maneira. Embora existam diferenças regionais significativas no impacto de cada uma destas crises, os mercados e as cadeias de suprimentos estão ainda mais fragmentados hoje originado pelo e-commerce ou estratégias expansionistas. Depois, há a evolução do digital. A adoção em larga escala de novas tecnologias, como IoT, análise avançada e aprendizado de máquina, todos quando corretamente utilizados, está redefinindo as oportunidades disponíveis para as empresas e a velocidade da mudança possam ser capturadas. Todas terão sua maturidade testada pelo grau de alinhamento de seus processos internos.

Tomemos o exemplo, citado em McKinsey (2019), de uma empresa global de bens de consumo embalados, de acordo com caso da World Economic Fórum. Recentemente, ela automatizou suas linhas de produção com um portfólio integrado de ferramentas da Indústria 4.0, incluindo gerenciamento de desempenho digital, automação do ERP habilitada para IoT e uso intensivo e integrado de modelagem e simulação (PPCP) para avaliar e melhorar suas operações de fabricação e analíticos para identificar oportunidades e fraquezas. Juntas, essas mudanças ajudaram a aumentar a produtividade em 160%, com reduções de mais de 40% nos desvios de qualidade e no estoque.

A digitalização pode ser uma faca de dois gumes, no entanto, ajudando pessoas a romper barreiras, mesmo quando os mercados e concorrentes aumentam as restrições de desempenho. As constantes melhorias anuais de produtividade que se tornaram o padrão em muitas fábricas podem não ser suficientes para manter a empresa à frente em um mundo onde as ferramentas digitais estão oferecendo melhorias dez vezes mais rápidas. Simplificando, os movimentos ousados ​​de ontem podem ser muito tímidos diante dos desafios de amanhã e você somente copiar ou não quebrar velhos paradigmas de processos.

4. Construindo cadeia de valor resiliente

As empresas não podem evitar a volatilidade e a incerteza gerada pelo mercado ao decisões político-econômicas, mas podem e devem tomar ações específicas para aumentar a resiliência de suas cadeias de valor para sobreviver. Definimos resiliência nesse contexto específico como a capacidade de uma organização de Serviços Compartilhados de continuar reduzindo seus custos operacionais resultantes do aperfeiçoamento de seus processos (padronização, simplificação e integração numa visão ponta a ponta) e aumentando a automatização de rotinas com a mensuração de indicadores pertinentes por meio de mudanças cíclicas e estruturais na oferta e na demanda de seus produtos e serviços.

Na prática, a resiliência possui um componente de produtividade e um componente de flexibilidade. A produtividade alta e em constante crescimento ajuda a empresa a proteger suas margens, permitindo realizar mudanças menores e contínuas e dando-lhe o poder de fogo financeiro para responder às maiores. Enquanto isso, a flexibilidade de uma cadeia de valor é determinada por sua capacidade de continuar gerando lucro sob diferentes condições de oferta e demanda, nossa responsabilidade nisto, como Centros de Serviços, é a redução do custo operacional. Uma empresa pode reduzir seus custos com a queda da demanda? Ele pode aumentar a produção para aproveitar os picos do mercado? Ele pode ajustar suas atividades de compras para se beneficiar das flutuações nos custos de insumos? Para quem executa corretamente os conceitos de Serviços Compartilhados, a resposta é, sim, com certeza.

5. A necessidade de novas métricas e novos comportamentos

Mesmo as empresas que reconhecem o poder de produtividade superior e flexibilidade operacional podem não ter métricas eficazes para medi-las e avaliá-las de formas eficiente. Hoje, poucas organizações podem alegar entender o quão flexível suas cadeias de valor são comparadas às dos concorrentes, por exemplo. Eles também não sabem onde devem fazer as alterações para obter a flexibilidade que desejam pois muito do conhecimento adquirido foi realizando processo de benchmarking e não de aprendizagem.

Acreditamos que o desenvolvimento de maneiras eficazes de medir, desenvolver e gerenciar a flexibilidade da cadeia de valor será fundamental, e um grande desafio, para as empresas e, em sua maioria, gerada por informações advindas dos processos envolvidos em Serviços Compartilhados, já nos próximos meses e anos. A flexibilidade da cadeia de valor é multidimensional e específica ao contexto de mercado em que a organização está inserida. Medi-la detalhada e granular exigirá imparcialidade das metas, mesmo que numa visão imediatista, não apresente os resultados desejados promocionalmente. A maturidade e a excelência organizacional não se atingem em curto espaço de tempo e não deve ser reconhecia internamente, mas pelo resultado obtido pelo mercado. 

As organizações de Serviços Compartilhados que lidam com essas complexidades de métricas e metas precisam entender melhor quando, onde e como direcionar seus esforços para se tornarem mais resilientes. Somente com tempo, métricas reais e equipes dedicadas as organizações de Serviços Compartilhados poderão definir tendências para acompanhar seu progresso e fazer comparações, não com seu progresso e fazer comparações, não com outras empresas, mas com seu aprendizado e evolução, endossados por padrões de liderança medidos pelos resultados à organização e na demonstração da capacidade de gerar flexibilidade e produtividade com foco em evoluir a organização.

Os líderes eficientes de organizações de Serviços Compartilhados que lidam com essas complexidades de métricas e metas precisam entender melhor quando, onde e como direcionar seus esforços para se tornarem mais resilientes. Somente com tempo, métricas reais e equipes dedicadas as organizações de Serviços Compartilhados poderão definir tendências para acompanhar seu progresso e fazer comparações, não com outras empresas, mas com seu aprendizado e evolução, endossados por padrões de liderança medidos pelos resultados à organização e na demonstração da capacidade de gerar flexibilidade e produtividade com foco em evoluir a organização.

Os líderes eficientes de organizações de Serviços Compartilhados já entendem que seu papel vai além de produzir informação sobre sua maturidade, sobre o atingimento de indicadores de satisfação adaptados do método NPS – Net Promoter Score para distribuição de bônus ou benchmarks que referenciam seu desenvolvimento comparado a outros, e muitas vezes nem são dos mesmos ramos de atividade e porte. Eles já entenderam o papel crítico que as operações de Serviços Compartilhados, desempenham no resultado geral dos seus negócios.  

6. Conclusão

Acreditamos que a próxima fronteira para muitas empresas será o desenvolvimento de modelos operacionais que adotam a resiliência e uma gestão com mais empatia no cliente e melhores controles na gestão de risco capazes de suportar choques e capturar oportunidades emergentes com mais rapidez e eficácia do que as dos concorrentes. Onde a organização deve concentrar seus esforços? As respostas para as três perguntas abaixo podem fornecer um guia de reflexão.

  1. Quais oportunidades foram difíceis de buscar devido à falta de recursos ou capacidade de resposta em sua organização?

  2. Quais são os pontos mais inflexíveis em suas operações atuais e quais são as causas origem ligados à esta rigidez?

  3. Onde o uso efetivo de soluções digitais e analíticas pode dar celeridade para provocar mudanças significativas com base em indicadores de desempenho (eficiência, custos e satisfação do cliente) e que sejam mais importantes para a evolução de sua organização de Serviços Compartilhados e contribuição para o alcance dos resultados, operacionais e econômicos, necessários para sua organizar se destacar ou sobreviver neste mercado em transformação?

7. Referências

Baixar em PDF


Previous
Previous

Síndrome de Gabriela: A Barreira entre a Tradição e a Aprendizagem para a Mudança

Next
Next

Pensar Cansa: A Era da IA e o Declínio do Pensamento Cognitivo